segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O barulho do silêncio

O barulho do silêncio
Ronaldo Magella – professor, poeta, escritor, blogueiro, radialista, jornalista e mais nada


“Nada não”, foi o que você começou a repetir, no mesmo tom, com a mesma voz, sempre o mesmo olhar, distante, sem vontade, ocupada consigo mesma, em si, fechada, trancada, sempre lá, do meu lado, cá, como se um muro, sim, ele existia,  aceitava aquelas duas palavras como se elas quisessem dizer, “está tudo bem, não se preocupe, vai passar, só me deixa aqui um pouco”, me deixa, um pouco, queria dizer tudo o que não conseguia perceber, você não queria ser deixada ali um pouco, já não iria passar, não havia mais retorno, não havia mais algo a ser dito, o silêncio estava cantado com todas as letras, em sons destoantes, em riffs alucinantes, e dançávamos loucamente sobre o nosso próprio túmulo, abraçados, morrendo aos poucos sem conseguir nos salvar, embriagados pelo loucura de ainda estarmos juntos, talvez pela esperança, mas  não sei se acreditava ou se me enganava se aceitava ou até mesmo queria que assim o fosse, não havia reação, uma força maior me tomava o impulso, calara a voz, silenciava minhas reações, como se preso estivesse e não fosse possível dá um passo adiante, pensava, desgostosamente, que tudo iria ficar bem logo mais, que era um pedaço de tempo, que era possível de acontecer, éramos casais e isso acontece com eles, sim, éramos bons, os melhores, a vida iria seguir e a gente melhorar, mas era bem assim que as coisas estavam em nós, para nós, o silêncio que se tomara de nós, doía como uma ferida aberta, o som do caminhar, o cheiro do perfume, o timbre da voz, tudo aquilo nos irritava, já não nos suportávamos, não sentíamos alegria em viver, de viver ali, e aos poucos não tínhamos mais o que falar, surdamente ouvíamos o nosso amor, tínhamos gritos de socorro para alardear, e sem falar, gritávamos, que alguém nos salvasse, por Deus, socorro, pedíamos, alguém, peço por favor, nos tira daqui, da nossa morte, da nossa dor, do nosso fim, em vão, queríamos que os outros nos pudessem ver, ouvir, perceber, chorávamos tanto, sentíamos tanto, cansávamos até para nos confessar, guardávamos em nós o que de pior sentíamos, e era aos outros que suplicávamos, pois em nós nada mais restava, já havia sido decretado a falência do que havíamos sido um dia, éramos silêncio e dor, um som morto, uma luz escura, uma angústia sem fim, um tempo que se arrastava penante, quando tudo era apenas vazio, apossando-se, concreto, como uma rocha, bem ali, em meio a nós, era papável, duro, forte, intenso, mortal, primeiro foi matando o que sentíamos, depois o que poderia nos salvar, as palavras, enchíamos nossa vida de coisas e perdíamos a nós mesmos a cada instante. “Sim”, “não”, “pode ser”, “talvez”, hum rum”, tínhamos sidos expulsos do paraíso, não tínhamos mais dicionários, livros, revista, voz, som, barulho, palavras, frases, não havia música, palavrão, raiva ou dor, saudade ou ciúme, tristeza ou mágoa, estávamos indiferentes das gentes, não nos cabíamos em nós mesmos, de lado agora era sempre mais interessante, dormir a nossa cura , estar longe o nosso desejo, voltar o nosso inferno, falar a nossa dor, sorrir nos magoava, quanta dor muitas vezes há na felicidade e na alegria falsa, em manter as aparências, em ter que viver o que já se não podia mais, talvez nunca em toda a nossa a ideia da morte nos acalentava tanto o coração, já estávamos mortos, só queríamos que alguém nos enterrasse, vivos, nossa dor era a nossa doença, estarmos juntos era a nossa condenação, o silêncio o nosso pecado, sorrir a nossa maldição. 

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