sábado, 21 de setembro de 2013

Gosta quando ela fala dela

Gosta quando ela fala dela

Ronaldo Magella – professor, poeta, escritor, blogueiro, radialista, jornalista e mais nada



Gosto quando ela fala, reclama do batom, me diz que precisa fazer as unhas, que está com raiva do professor da faculdade, que seu cabelo está ruim, que precisa fazer regime, que suas roupas não prestam mais, que ela está com fome, gosto, gosto quando ela fala dela e reclama de mim, que eu acordo cedo demais, que também estou ficando mais gordo, que nunca mais lhe escrevi algo bonito, adoro quando ela fala sem parar, fico ali parado, olhando, não posso fazer mais nada, ela fala, apenas fala e escuto, só escuto, nada mais. Quando ela me encontra, me beija e vai logo falando, amo, e ela fala, quando estamos sentados, parados e ela falando, olha pra mim, ela pede, escute, estou falando com você, sabe a Karol? Pois é, voltou com o ex, eu não sei quem é a Karol, mas faço cara de quem a conhece há muito tempo, sim, sim, sei, o que houve? E ela rir, sabe dos meus truques, mas não deixa de me contar. O celular toca, ela diz, não saia daí, a conversa não terminou, oi, alô, e ela conversa com alguém que nem sei que seja, faço um esboço para me levantar, ela segura meu braço, não saia, ela me diz de forma imperativa, volto a sentar, ela desliga o celular e volta a falar, então, como eu dizia, e eu escuto pacientemente sem piscar. Gosto como ela faz mil coisas ao mesmo tempo e muda de assunto, fala da gente, responde uma mensagem no celular, olha pra alguém que passou, reclama de si, da demora da pizza, da roupa da menina que acabou de passar, segura minha mão, pergunta como vai minha mãe, as crianças, os meninos, como será minha semana, se viajo no final de semana, e antes que eu responda, ela mesma já entra em outro assunto, que semana que vem estará de férias, que iremos nos ver mais, teremos mais tempo, que poderemos ir ao cinema, ver filmes, caminhar no final da tarde, ela vai falando, não tenho do que reclamar, gosto de vê-la assim feliz, contate e segura, confiante e tranquila, já sei estou aprendendo as tomadas de turnos conversacionais, sei quando devo apenas olhar e escutar, quando devo responder ou perguntar, quando devo falar, intervir, e claro, ela não perde o fio, se ela está falando da faculdade, e intervenho, amor, amor, a pizza, qual sabor, ela olha o cardápio, escolhe dois sabores, e volta outra vez para o que estava falando, é o seu momento de desabafo, sou o seu psicólogo, eu a escuto, ela me fala, eu entendo, ela fica mais leve, já entendi isso, ela precisa falar, precisa se contar e me contar, dizer suas coisas, falar da sua, ela acumula todo durante a  semana e me explica com detalhes num único momento, no final ela me diz o quanto gosta de mim, que sou importante e como é bom estarmos juntos, acho graça, apenas escuto o que ela diz, fala, sente, pensa, sou a sua terapia, adoro quando ela fala, sou o seu confessionário. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário